Henrique Araújo: “É nosso dever chegar aos 5 mil votos e eleger dois vereadores.”

Na segunda parte desta entrevista, Henrique Araújo propõe-se a analisar e a propor caminhos alternativos para a gestão da Câmara Municipal. Através do Movimento 2030, que lidera, garante ter um “projecto para pôr em prática no imediato”, assente num maior rigor nos gastos de curto prazo e numa visão a longo prazo no âmbito das obras estruturais. Promete criar figuras de trabalho para agilizar licenciamentos e disciplinar os processos de custeamento dos empreendimentos camarários. Já no âmbito dos apoios sociais e às colectividades, considera essencial ajudar as entidades a garantir a sua autonomia gradual.

Aos eleitores, reconhece não conseguir convencer “quem está satisfeito com o estado das coisas”, mas aponta o conhecimento profundo dos “corredores da Câmara” como um trunfo para um bom resultado eleitoral dentro de 12 meses.

 

O que norteou a fundação do Movimento 2030?

O nome 2030 vem da geração de jovens entre os 20 e os 30 anos, e das suas ambições. O objectivo é que o plano de investimentos se mantenha actualizado daqui a 10 anos. O Município tem uma receita corrente na ordem dos 35 milhões de euros. Ou seja, este ano temos um orçamento de 63 milhões, mas o acréscimo advém de candidaturas europeias, que hoje temos e amanhã podemos não ter. Os 35 milhões de euros são certos: derivam de IMI, percentagem do IRS, da derrama, do FEF [Fundo de Financiamento das Freguesias]. Podem variar qualquer coisa para cima, não para baixo. Nós montamos um modelo político que é: 50% é para despesa, 50% para investimento. Ou seja, temos 17,5 milhões [anuais] para investimento. A despesa de 17,5 milhões advém de salários dos funcionários, luz pública, seguros, tudo o que faz a Câmara funcionar, e hoje anda na ordem dos 15 milhões. Temos ainda uma bolsa de 2,5 milhões para situações que possam ocorrer. Nós traçamos um plano de 10 anos, que perfaz 175 milhões de euros. E não estamos a pensar nos fundos europeus. Entendemos que vai modernizar, definitivamente, o município, tornando-o competitivo em termos regionais.

 

Que despesas, correntes ou de capital, podem ser reduzidas?

Temos luz pública a iluminar o pinhal toda a noite: as pessoas estão em casa a descansar depois do dia de trabalho, e o município está a consumir os seus recursos de impostos a iluminar o pinhal, onde não passa ninguém. Só aí nós podemos ir buscar muito dinheiro. Ainda na luz, a Câmara paga em consumo próprio um valor na ordem dos 400 mil euros. Estamos a falar de uma fortuna. Acho que a Câmara não tem tantos edifícios assim. Noutra área: o Centro de Arte de Ovar tem um prejuízo efectivo na ordem dos 400 mil euros. A Câmara tornou-se uma promotora de eventos quase profissional, até tem nos seus quadros director de luz, director de palco… A sociedade não tem a consciência desse prejuízo. Tudo isto tem de ser repensado. A piscina tem um prejuízo contínuo, está envelhecida. Temos duas caldeiras a cargo, mas uma está desligada. A piscina tem pouca oferta em termos de tanque. Serve 800 pessoas, mas não é por falta de procura: temos o espaço, temos o consumo, temos os funcionários, temos toda a logística. Então, na altura já em funções na Câmara, sugeri a construção de um segundo tanque, de dimensão olímpica, para, em vez de servirmos 800, passarmos a servir 1800 pessoas. Nos transportes: só em despesas de táxi [para suprir carências no transporte escolar e médico], o Município paga cerca de 150 mil euros por ano.

 

Qual o melhor método para tornar a gestão camarária mais eficiente?

Nós queremos ter um director orçamental da Câmara, uma figura que não existe actualmente. Não queremos que essa pasta esteja perdida nos corredores da Câmara Municipal. Essa pessoa deve saber perfeitamente o valor que a Câmara tem para despesa. O grande problema do Município, aliás de vários municípios, é que o presidente vai, por exemplo, a uma inauguração, a um jantar de uma colectividade, e sai de lá com uma despesa para a Câmara porque alguém foi ao microfone pedir um apoio, então o presidente dá um apoio. O presidente da Câmara não pode distribuir o dinheiro da Câmara desta forma, como se fosse o Pai Natal. Noto uma deterioração na gestão destes pequenos gastos. Os políticos dizem que gestão pública não é gestão empresarial. Antes fosse: no mundo empresarial, quem fizer 1/10 daquilo que eu vi na Câmara, fecha portas. O problema é que o dinheiro público tem um orçamento aprovado e está logo disponível desde o dia 1, não se tem de ir atrás dele. E, portanto, leva-se a questão com leveza.

 

Como justifica este modelo de gestão?

O grande objectivo desta gestão é manter votos, ser eleito outra vez. Creio que o modelo está instalado da seguinte forma: um presidente da Câmara de Ovar precisa de 12 mil votos para ganhar as eleições e ter autonomia. Então, criou em volta de si uma rede de 12 mil votos, por onde distribui o dinheiro. A Câmara Municipal tem avenças com juristas, um quadro de juristas caríssimo, e ainda tem avanças com outros juristas, por coincidência, também pertencentes à mesma estrutura. Isto faz com que metade das pessoas já nem vá votar, porque já nem acreditem em nada disto, e com toda a razão. Trata-se de uma rede fechada. Ou te alimentas dela, ou estás à margem: há colectividades que são “castigadas” porque seus membros não são do partido que governa o município. E se me perguntarem “Se fores eleito vais ser igual?”: Não, não vou, prefiro ir para casa, porque eu tenho a firme certeza de que isto está a destruir o país. Não é só a Câmara de Ovar, é o país.

 

O que está a descrever, na linguagem política, chama-se clientelismo…

Nós não podemos aceitar que a Câmara compre uma propriedade por milhares de euros para pôr ao dispor de uma única colectividade. O que é que um cidadão de São Vicente de Pereira, que não conhece a colectividade, não está naquela área, tem outro pensamento de vida, mas contribuiu com os seus impostos, pensa?

Leia a entrevista na íntegra na edição nº390 do nosso jornal.

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