Acção judicial de Orlando Sá levou, para já, à suspensão por parte do Departamento de Urbanismo e Planeamento da Câmara Municipal de um loteamento de 25 lotes. O empresário está a tentar provar judicialmente que a Junta de Cortegaça se apropriou ilegalmente dos terrenos
Há novos desenvolvimentos relativamente à acção judicial intentada pelos cidadãos Orlando Sá, António Oliveira e Américo Dias relativamente ao processo de loteamento em curso na freguesia de Cortegaça. Conforme explicou ao N há cerca de um ano, primeiro em artigo e em entrevista, Orlando Sá está convencido de que o loteamento é ilegal pois o regime de usucapião alegado pela Junta de Freguesia de Cortegaça não será aplicável neste caso.
O processo continua a decorrer nos tribunais, mas, para já, o grupo de cidadãos obteve uma pequena “vitória”: a pressão jurídica e política em diversas instância levou, em Março último, a Câmara Municipal a suspender até sair a sentença o referido loteamento até aqui em curso. Paralelamente, o grupo pretende provar que a alteração do Plano Director Municipal de 2015 também não respeitou todos os parâmetros da legalidade, dado que, à data, a escritura que pugna pela propriedade dos terrenos por parte da Junta de Cortegaça, de 2011, não era pública. De resto, conforme Orlando Sá nos confidenciou, era ele mesmo presidente da Assembleia de Freguesia de Cortegaça e o referido documento não era do seu conhecimento. De forma aparentemente deliberada, o anúncio público da escritura de justificação (obrigatório na imprensa local) não foi publicado no jornal “O Povo de Cortegaça” – que seria, em princípio, o mais lógico e eficaz para amplificar a divulgação junto dos fregueses. Por esta razão, reitera que estamos perante “um golpe” contra o interesse público e popular dos cortegacenses, o qual “não pode deixar passar em claro”.
O que está em causa?
Tudo começa em 1912, no Portugal recém-laicizado da Primeira República: é nessa data que assenta o argumento da Junta de Freguesia de Cortegaça para reclamar a propriedade dos terrenos. A instituição defende que os terrenos foram “doados verbalmente” pela Paróquia de Cortegaça à época (recorde-se que, na Monarquia, a figura da Paróquia era a equivalente do ponto de vista executivo às Juntas e Câmaras actuais), na transição de regimes. Argumento que não convence o advogado de Orlando Sá: “A laicização do Estado dá-se em 1911, portanto este acontecimento nunca pode ter acontecido em 1912, dado que as paróquias já não detinham nesse ano as responsabilidades e os regimes de propriedade alegados pela autarquia. Sendo o regime florestal criado pelo governo em 24/12/1901 e 9/8/1922, o referido prédio ficaria afecto àquele, total ou parcialmente, passando, assim, a integrar o domínio público florestal sob a jurisdição do então Ministério da Agricultura. Acresce que, a doação de bens imóveis, mesmo à luz do Código de Seabra, só seria válida se fosse realizada por escritura pública, o que não ocorreu. Ou ainda, os testemunhos invocados para reforçar a relação de propriedade são estranhos porque parecem advir de uma declaração sobre o que não conhecem. Donde, muitas dúvidas se levantam relativamente à legalidade da escritura de justificação.”, explicou.
A 31 de Janeiro de 2011 dá-se a celebração da referida escritura: esta é a escritura que o empresário diz que esteve oculta do domínio público “durante pelo menos nove anos”. Apenas quando lhe foi entregue, na sua caixa de correio, um conjunto de fotocópias com os planos dos 25 lotes, Orlando Sá tomou conhecimento, já com o loteamento numa fase avançada.
A 26 de Agosto de 2015, no mandato de Salvador Malheiro, foi promulgado um novo Plano Director Municipal, que, por inerência, estará também ferido de ilegalidade, dado que tem em consideração a escritura de 2011 para fundamentar a mudança de tipologia do terreno, passando a estar passível para construção.
Em suma, para o grupo de contestatários, a suspensão municipal do processo de loteamento é indicativa “de que estão cientes de que incorrem em riscos judiciais”. Porém, não se pode dizer que se trata de uma vitória, mas apenas um ganhar de tempo. Existem três vias possíveis para que o loteamento seja definitivamente interrompido: a) decisão judicial definitiva dos tribunais competentes; b) decreto da Câmara Municipal ou da Junta de Freguesia de Cortegaça anunciando o cancelamento; c) parecer da CCDR-Centro que implique a revogação do PDM de 2015.
Assim, Orlando Sá elencou, para o imediato, um conjunto de propostas e exigências face ao exposto, a saber:
“1. O Presidente da Câmara deve mandar arquivar tudo o que é loteamento da nossa floresta e todos os negócios imobiliários que, antes deste PDM, nunca se poderiam fazer;
- A Câmara e a Assembleia Municipal devem revogar o actual PDM e devolver à floresta o que é da floresta. Em alternativa, exigir à CCDR-Centro a suspensão e revogação do PDM;
- A Câmara e o Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) devem corrigir os erros que cometeram e fazer uma replantação total da nossa floresta, respeitando assim as vontades do povo e as recomendações da Assembleia da República;
- O Executivo deve dar um passo atrás e abandonar essa ideia maluca de comprar terrenos na Serra da Malcata com o nosso dinheiro para tentar compensar a razia e destruição de património que não lhe pertence.
Em conclusão – A nossa floresta pertence a todos e às gerações que ainda estão para nascer.”
Leia o artigo na íntegra na edição nº414 do nosso jornal.