Ex-autarca Miguel Reis nega que recebeu dinheiro de Francisco Pessegueiro

Na semana passada decorreram na quinta (6 de Março) e sexta-feira (7 de Março) sessões do julgamento da Operação Vórtex, no Tribunal de Espinho. O ex-autarca da Câmara Municipal de Espinho, Miguel Reis começou a prestar declarações ao colectivo de juízes e ao Ministério Público. Os temas incidiram na relação de Miguel Reis com os arguidos, o jantar de aniversário da esposa no restaurante A Cabana, um alegado encontro com Francisco Pessegueiro para receber “taxas de urgência” e ainda os móveis da casa nova.

No início das suas declarações o ex-autarca Miguel Reis começou por dizer ao juiz Carlos Casas Azevedo que  após ter sido convidado pela segunda vez para concorrer às autárquicas de Espinho em 2021, aceitou com a condição do seu lema ser “Juntos Fazemos Melhor”. Explicou que após a sua eleição e tomada de posse encontrou a Câmara Municipal com “grandes constrangimentos financeiros porque o dinheiro era para pagar as obras”. Por outro lado, “os serviços atrasaram” e “as pessoas queixavam-se”. Contou que já conhecia o arquitecto Pedro Castro e Silva da universidade, que era seu amigo, e que o trouxe para trabalhar na Câmara para Chefe de Divisão de Planeamento Estratégico, e que após a reestruturação este passou a ser o Director de Departamentos. Segundo o arguido a sua função era “ser um fio condutor e ter uma comunicação entre departamentos”.

Sobre o técnico da Câmara, José Costa disse ter tido reuniões enquanto vereador da oposição. Sobre a permanência do técnico nas suas funções disse que era bem vista dentro e fora da Câmara. Quanto a ter sido abordado pelos arguidos para o efeito Miguel Reis disse ao juiz: “não me recordo”. “Nunca dei abertura para isso. Tinha uma opinião formada relativamente ao José Costa.”, acrescentou.

Quanto ao técnico da Câmara, Álvaro Duarte disse ter uma relação superficial e que quando tomou posse viu que “estava muito desgastado”. Daí resultou  uma  conversa para lhe dizer que “as condições em que estava na altura não permitiam que ele desempenhasse as suas funções” e, mais tarde, a destituí-lo de chefe de divisão. O arguido Paulo Malafaia conheceu numa reunião breve de cumprimentos, em que ele lhe apresentou a sua estratégia de construção a custos controlados para Espinho. Sobre Francisco Pessegueiro disse não ter uma relação pessoal e que a sua postura foi enquanto autarca “de estreitar relações, como fez com outras pessoas”. Disse que a primeira mensagem que recebeu de Francisco Pessegueiro foi no dia em que venceu as eleições. “O meu número de telefone era público. Nunca tive negócios com ele.”, afirmou ao juiz.

Acerca do seu telemóvel, Miguel Reis disse que a sua esposa detectou alterações. “Saí de grupos. Há mensagens que não existem. Foram feitas diligências e a minha mulher começou a receber telefonemas.”, contou.

Carlos Casas Azevedo quis saber se alguma das licenças ou alvarás não tinham sido validadas por Miguel Reis. “Quando os documentos chegavam ao meu gabinete vinham validadas pelo chefe de divisão, técnico superior e director de departamento. O meu gabinete despachava.”, explicou. “Nunca foi contrariada a aprovação dos serviços.”, acrescentou. O ex-autarca contou que alguns despachos não foram validados por ele porque teve de delegar funções para maior celeridade. No entanto, disse que o que estava definido era o que explicou.

 

“Rejeito categoricamente que tenha sido entregue dinheiro.”

No que concerne ao jantar de aniversário da esposa no Restaurante A Cabana, da família Pessegueiro, do qual Miguel Reis disse ser frequentador habitual. O arguido contou que ao almoço pediu ao funcionário para reservar uma “mesa com vista para o mar”. No decorrer do jantar percebeu que Francisco Pessegueiro “tinha preparado uma surpresa” e o “desconforto gerou-se”, recordou. “Não aceito almoços, nem jantares. Não queria que me fosse oferecido.”, afirmou. Ao contrário do que consta na acusação, Miguel Reis disse que perante a situação “não houve bolo, nem champanhe” e que foram para outro lugar. Sobre a foto da salada de búzios enviada a Francisco Pessegueiro, Miguel Reis disse que era frequente fazê-lo também com iguarias de outros restaurantes.

No que diz respeito à alegada necessidade de dinheiro, aquando da compra da casa nova e sustentada na acusação, o ex-autarca disse ter ficado “estupefacto”. “Nunca estive a necessitar de dinheiro. Não tinha problemas de liquidez.”, afirmou. Por outro lado, acrescentou que estava estável a nível financeiro e que “os gastos que tinha eram inferiores às receitas”. Sobre a necessidade de mobiliário para a nova habitação afirmou ser falso. “Se há coisa que tenho é mobiliário.”, afirmou. “O que precisávamos era de alguns apontamentos.”, acrescentou.

Quando questionado pelo  juiz sobre um encontro a 20 de Setembro de 2022 com Francisco Pessegueiro para alegadamente lhe ser  entregue uma pasta com cinco mil euros relativos a duas taxas de urgência  Miguel Reis afirmou: “Isso é categoricamente falso.” Quando confrontado pelo Ministério Público com fotografias suas nesse dia, na rua com “uma pasta com algum volume”,  com a escuta telefónica em que Francisco Pessegueiro pede à irmã cinco mil euros “em notas grandes, divididas muito direitinho, sem volume como da última vez”, e ainda com um telefonema em que o mesmo conta ao arquitecto João Rodrigues o suposto encontro num café em Espinho em que relata a entrega de uma capa com “dois processos e duas taxas de urgência”, Miguel Reis negou o  encontro e disse que esteve durante a tarde na Câmara. Quanto à capa com que foi visto disse que continha documentos para a Assembleia Municipal que se iria realizar nesse dia à noite. “Rejeito categoricamente que tenha sido entregue dinheiro.”, afirmou.

Ainda sobre os móveis que adquiriu para a casa nova referiu que o papel de Francisco Pessegueiro foi de fornecer os contactos e que tudo foi tratado com a esposa. “Nunca se falou em ele me oferecer nada.” O ex-autarca disse que houve aproveitamento da situação. “Um grupo de pessoas utilizou o meu nome para dizer ao senhor dos móveis que tinham conseguido mais um piso.” Disse ainda que se soubesse que o “senhor dos móveis” era o dono do empreendimento Golden 24, com o projecto na Câmara este “já não fazia móveis nenhuns”. Por outro lado, quis ainda esclarecer a sua função relativamente aos despachos. “Nunca me comprometi a aprovar ou reprovar projectos. Não tinha esse poder.”, afirmou.

Quanto ao pagamento dos móveis o arguido explicou que foram “pagos parcialmente porque, entretanto, as suas contas foram congeladas.”

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